sexta-feira, 23 de março de 2012

O PRESENTE, SEMPRE...

O PRESENTE, SEMPRE...

Te devo um poema...
Daqueles profundos.
Das cavas do mundo,
 Pra que valha a pena.


Te devo, Luiz, 
Pela luz em minha vida.
Um ano atrás
Foi nova partida.

Te devo um escrito,
Respeitoso, em rito,
Que pague com juros
Seu Haikai bendito.

Te devo palavras,
Te devo fonemas,
Que mandem às favas
Maçantes esquemas.

Te devo estrofes,
Um cordel bonito,
Que soe e ressoe,
Energia em grito.

Sua essência não mente, poeta-empresário
O das mãos de ouro
Transmutas palavras
As torna em tesouro

O rio, sim, muda, poeta-empresário
A vida da gente, em essência, bem sabes
É sempre e toda
Um aniversário
Em 20 e 21 de março de 2012, relendo LIMIAR
e buscando a Lua na noite paulistana

sexta-feira, 16 de março de 2012

Primeiro poema a um filho

Primeiro poema a um filho 

Eduardo, filho sensível
Canta, dança e atua
Corajoso guerreiro
Agarra a paz que é sua

Sorri como uma criança
A tal criança vindoura
P´ra nos ensinar andança
Na nova estrada duradoura

A estrela que olhamos
Ao retomar histórias
Fantásticas que já contamos
Pai e filho personagens de aventuras e glórias 

Companheiro, malandro, moleque
Que em meu coração mexe e mora
Como o ipê amarelo, o tatu
E o periquito que adora

Chocolates que nos unem
Na dança do pode, não pode
Bola de meia e de gude,
Música que nos acode

Guerreiros, sim, ficam bravos
Garotos, sim, compartilham
Me ensina, filho, me ensina
Que meu coração é partido

É partido pela vida
Que só agora é minha
Briga, meu nobre guerreiro
Luta por sua sina

Que serei seu companheiro
Admiro sua graça divina
Pressinto seu paradeiro
Como um dos que ilumina

Primeiro poema a uma filha

Primeiro poema a uma filha

Luana, cadê sua saudade?
Seu brilho de paixão
De feminilidade...
Se foi com a idade?

Luana, me diz aonde se foi
O jogo do remexo de corpo
O riso disfarçado
Nariz, olho, beijo

Onde está seu pulo
O drible comportado
A ginga do sorriso
No “parque-pai” deitado

Anda mais distante
Os livros tão fechados
Não vemos o gigante
Não deitas a meu lado

Uma fênix de alegria
Das cinzas fez criança
Feliz, bondosa, amada
Das que com o pai dança

Vidrada, alma lavada
Volta p´ra perto perto, princesa
Passa logo dessa fase
Não vivo sem sua beleza

domingo, 11 de março de 2012

É Veríssimo: um Ruís Ferdinando Sempre Inacabado relê e atualiza o Millôr Definitivo!

Quem diria... Eu tenho inveja do Veríssimo e o Ruís tem inveja do Millôr, que como eu, ama sacanear o Sarney, que não ama ninguém...

Bunda (Millôr Definitivo, p.59)
“Quais são os limites da linguagem? Quem os traça? Claro, a publicação pode definí-los: bunda não sai. E abundante? E culatra? E recuar? E acuado? Que palavra sugere que eu use em vez de bunda? Nádegas? Juro que aí, sim, eu coraria de vergonha. Traseiro, pompom, bumbum, assento, posterior? Não, eu tinha que usar bunda, a palavra certa, bonita, essa bonita palavra africana. Jamais usaria um eufemismo gracioso. Como humorista profissional me proíbo gracinhas – coisa de amador. Se usasse rabo, palavra mais forte, também extremamente expressiva, estaria forçando a barra – no contexto da revista. Mas, muito bem; vetamos bunda no atual artigo. E se, em outro, eu escrever língua bunda, dos angolanos? Ignoro a existência da língua? Ou a chamo discretamente de língua nádegas (bilhete a um editor da revista Veja, 1978)”


Quem diria... Em 1978 se discutiam as possibilidades de bunda. Da mesma bunda que hoje perambunda irrelevante pelos Big Brothers preocupados com cenas, não de sexo implícito, e sim dos pseudos estupros quase explícitos. A bunda merecia um fim mais esplendoroso. Linda palavra. Daquelas que explicam em pormenores, por si mesma, exatamente e em detalhes o que significa. Outro dia entrei na sala da imigração no aeroporto de Guarulhos e gritei: “Bunda!”. Imediatamente um grupo de haitianos, um monge tibetano refugiado da violência chinesa e uma linda moça nativa de Ingria, que só fala Votic, botaram a mão para trás naquele tradicional movimento de “a minha, não”. Palavra que despreza as últimas barricadas contra a impiedosa globalização, as barreiras linguísticas. Palavra onipotente que devia ser sempre escrita só com maiúsculas: BUNDA.

É Veríssimo: um Ruís Ferdinando Sempre Inacabado relê e atualiza o Millôr Definitivo!

Quem diria... Eu tenho inveja do Veríssimo e o Ruís tem inveja do Millôr, que como eu, ama sacanear o Sarney, que não ama ninguém...

Big Brother (Millôr Definitivo, p.44)
“Em qualquer regime político, tem sempre um Big Brother te vigiando. Felizmente é incompetente”

No regime econômico capitalista os Big Brothers são inevitáveis, disfarçados de pesquisas de marketing, cadastros, mailings detalhados e database do Facebook. E estão cada vez mais competentes. Eu, por exemplo, apareço nas estatísticas como morando em Mirpur-Bangladesh e sendo poliglota (falo Crioulo de Seychelles, Língua sami de Ter, Kayardild e Votic).

Capitalismo/Socialismo (Millôr Definitivo, p.67)
“O socialismo é impossível a partir do pressuposto falso de que todos os homens valem o mesmo: na hora da partilha é o que se sabe. O capitalismo é impossível porque defende o pega-pra-capar: um homem pode valer um milhão de vez mais que o outro. Acredito que o limite matemático sensato (há que estabelecer algum limite) entre a absoluta igualdade e a absoluta desigualdade, é o fator 100. Nenhum homem pode ter um valor de mercado que lhe permita valer mais de cem vezes outro homem. Isso admitindo-se que o fator 1 dê pro essencial”

Eu, por exemplo, apareço nas estatísticas do Facebook como morando em Mirpur-Bangladesh e sendo poliglota (falo Crioulo de Seychelles, Língua sami de Ter, Kayardild e Votic). Valho R$ 679,03 para o FB. Se o FB vale US$ 1 bi e tem 850 milhões de usuários, valho 359,49 vezes mais que a média. Como bom brasileiro que sou, nem a lei do Millôr eu respeito...

É Veríssimo: um Ruís Ferdinando Sempre Inacabado relê e atualiza o Millôr Definitivo!

Características (Millôr Definitivo, p.65)
“Disse o assessor: ´Meu governador é um verdadeiro rato de biblioteca.´ Disse o assessor de outro governador: ´Pois o meu nem entra em biblioteca.´”

Esta foi fácil de atualizar. Basta trocar governador por ex-presidente. Daqui alguns anos, pode ser que biblioteca tenha que ser cambiada por alguma palavra que se refira ao mundo virtual em vez do brick&mortar. E tenho certeza que o que imortalizará esta reflexão do Millôr é a metáfora animal que cunhou. Animal em duplo sentido!

sábado, 3 de março de 2012

Será o imortal Sarney mais um a tentar desdizer o mortal Heráclito?

Será o imortal Sarney mais um a tentar desdizer o mortal Heráclito?

 “Tu não podes descer duas vezes no mesmo rio, porque novas águas correm sempre sobre ti” - Heráclito de Éfeso

Olhando para nosso querido Brasil, não posso deixar de matutar sobre Heráclito; se o emérito filósofo poderia estar se esquecendo, assumindo que já se sabia naquele tempo, que há exceções que justificam regras.

Ocorreu-me a figura simbólica de que pode haver algo estrutural, estático, “sempre o mesmo” pelo que instituições, sociedades, grupos ou indivíduos poderiam "passar". Esta idéia não é minha. Autores admiráveis me mostraram que podemos estar confundindo um gesto, ou mesmo o sexo, com algo que é “nosso” ou de “alguém próximo”. Quando, na verdade, o gesto e o sexo é que poderiam ser as estruturas fixas. E nós seríamos os “alguens”, que estariam passando por estas imutáveis perenidades. Esta é a “liga” que pretendi implícita nos parágrafos do texto abaixo.

Só adaptei a idéia à mania brasileira de assassinar a História.

Tudo começa na década de 90, aliás, a do primeiro impeachment brasileiro – não lembro exatamente o ano – quando Milan Kundera me enlevou com Imortalidade. Pela capacidade de juntar ironia e astúcia na busca, infindável, de respostas sobre a natureza humana e o significado da vida. Há dois trechos memoráveis no livro. O mais relevante para minha divagação aqui são exatamente as linhas que iniciam o livro. Imortalidade excitou-me com aquela sensação de quando o time preferido faz um gol, com menos de um minuto de jogo, a partir de uma linda troca de passes, concluída com alguma jogada sensacional. O livro é uma vitória por goleada, numa final de campeonato, contra o maior rival.

O trecho apaixonante descreve uma moça na “melhor idade”, entre sessenta e sessenta e cinco, nas palavras de Kundera, se despedindo de seu professor de natação. Graciosamente passando por ele ao sair da piscina, virando a cabeça, rindo e sensualmente movendo a mão no gesto de “tchau”. Como se “jogasse, brincando, uma bola brilhante e colorida a seu amante”. Num “gesto de menina de vinte anos”. A partir desta observação, o personagem-narrador do livro conclui que há uma parte de todo ser humano que vive fora do tempo. A essência do gesto prevaleceu, como se, na verdade, fosse o gesto que existisse, sendo a senhora-moça apenas o meio pelo qual tal gesto eterno se mantinha vivo, acontecia intermitentemente, sempre da mesma forma.

Pouco tempo depois, em um dos ensaios no livro 131 Posições Sexuais, de Lu Lacerda, eu aprendi, em forma literária similar, sobre outro fenômeno humano. Justamente o ensaio em que a complexidade, vastidão e vagueza da sexualidade é a tese defendida, por coincidência, pelo meu querido orientador, amigo e “cupido-culpado” por meu casamento, o antropólogo Everardo Rocha.

Naquele belo ensaio, Everardo descreve uma tribo que baseia o sexo na transitoriedade; “explicavam que o sexo passava pelas pessoas em meio ao seu próprio percurso. Quando ele acontecia, era sempre como um descuido na passagem ou um estacionamento temporário ou encontro incerto”.

Em respeito à forma, importante como o conteúdo, faz-se necessária uma analogia com o esporte bretão. O ensaio de Everardo é como um belo jogo amistoso, sem retrancas nem entradas desleais, com jogadas fantásticas, muitos gols e, no fim, um empate justo; pois quem disse que é preciso haver vitória para haver beleza?

Nos dois momentos sublimes de minha procura literária, uma idéia inteligente: a de que uma instituição social, o gesto de despedida e o sexo, é que é a estrutura fixa pela qual transitam ou "são transitadas" pessoas e sociedades. Sendo inacessíveis e imutáveis.


Lindas imagens.

Não pude deixar de me aproveitar deste criativo estilo literário para lidar com o recente fato de que a cassação de Fernando Collor de Mello foi “cassada” (se é pleonasmo, é mais que merecido), por José Sarney, dos anais do Senado brasileiro. Senado com “S” maiúsculo e brasileiro com “b” minúsculo, pois de fato assim o é, na língua culta como na realidade brasileira.

Lembrei de aulas em que supostamente eu aprendia, apesar das ausências propositais de discussões mais detalhadas sobre Palmares e outros milhares de quilombos, sobre a Cabanagem, sobre a Farroupilha. De minha anterior ignorância sobre nossa brasileira absorção do estado do Acre. Sobre a verdadeira “guerra do Paraguai”. Tentei vislumbrar, sem julgamento de mérito ou entendimento dos motivos, Rui Barbosa queimando os registros, documentos e arquivos sobre a escravidão; tentei sentir o cheiro de pedra quente caindo na implosão do presídio de Ilha Grande, reduzindo a pó o concreto da prova literalmente concreta de mais uma guerra civil que preferimos negar, país pacífico e povo harmonioso que somos. O ponto não é analisar e julgar tais atos. É simplesmente entender, como já sugeriram outros, a facilidade com que a cultura brasileira aceita a distorção da História. É como se a estrutura fixa na sócio-política brasileira fosse uma personalidade psicopata. O caráter assassino que tenta embalsamar, enterrar e cremar informações importantes sobre fenômenos relevantes, porém já idos, numa constante contratação barata de atiradores, matadores profissionais (ou, quem sabe, na contratação profissional de atiradores, matadores baratos...) para espreitarem e reduzirem nossa História com “H” maiúsculo a uma “istória” escrita errado. Como se por esta estrutura fixa de pessoalidades e estamentos, passassem consecutivas gerações de políticos, de cidadãos, de indivíduos e pessoas, de amigos transitórios e inimigos transitórios de reis transitórios, numa lamentável ode à nossa perene desigualdade social e incapacidade de dialogar sobre ela de forma madura e compreensiva.

A analogia futebolística? Aqueles jogos que são pura violência, que terminam interrompidos pelo árbitro após expulsar tantos jogadores de ambos os lados que o limite mínimo de atletas em campo é atingido. Ou um jogo em que meu time perde. Como a derrota de uma das melhores seleções brasileiras de todos os tempos, na Copa de 82, para a Itália. A Itália que nem era de Silvio Berlusconi.

Horrorosa imagem. Um rio de água parada, poluída.

Em São Paulo, num quarto de hotel, durante meu sabático e voluntariado, maio de 2011

Minha veríssima inveja


Minha veríssima inveja


Na primeira crônica que escrevi, especulei sobre os motivos pelos quais José Sarney, ex-presidente da república e permanente do Senado, extirpou dos anais do Congresso menções ao impeachment de Fernando Collor de Mello. Sou do tipo que não pára de especular. Re-refletindo, pensei se não teria o Maranhense sofrido pura e humana inveja... Afinal Sarney é um imortal de nossa Academia Brasileira de Letras. Aliás, especula-se que, também por inveja, Sarney almeja retirar dos anais do Senado o próprio Senado, dado que tal projeto é de Oscar Niemeyer, que ousa desafiá-lo em termos de Imortalidade...
Voltando ao impeachment: Millôr Fernandes disse que Brejal dos Guajas se trata de "uma obra-prima sem similar na literatura de todos os tempos, pois só um gênio poderia fazer um livro errado da primeira à última frase" e afirmou ainda que "em qualquer país civilizado Brejal dos Guajas seria motivo para impeachment ". 
Como poderia então o impeachment ser de outro? Único caso! Para posteridade histórica. Nem pensar! Marimbondos de fogo nos anais dos outros é refresco, mas não no meu, deve ter pensado o Poderoso. E dá-lhe a capada nos registros de impeachment do coitado do Collor, que tem aquilo roxo mas não é imortal. E nem presidente do Senado, pelo menos ainda...
A inveja que afeta a todos nós...
Eu não lembro bem quando, nem onde, tudo começou. Acho que foi quando li uma crônica de meu invejado sobre o Fernando Henrique Cardoso. Pouco depois que o, na época, Presidente da República, disse à imprensa que não o lia. Ele sugeriu ao chefe maior do Estado que aproveitasse o tempo que economizava “não o lendo” para reler um autor que ambos admiravam: Fernando Henrique Cardoso. Sublime, se bem lembrarmos que Fernando Henrique Cardoso dissera algo similar a “esqueçam tudo que escrevi”.
Dizem que por volta de três anos de idade percebemos, de repente, que estamos vivos. E temos nossas primeiras memórias. O parto de minha inveja primordial deve ter antecedido esta crônica sobre FHC. Porém é esta que minha memória me permitiu re-significar e definir simbolicamente como o motivo de meu pseudônimo: Ruís Ferdinando Falsíssimo.

Depois houve o marido que, acometido pela confluência conjugada e maravilhosa dos cinco sentidos em uma experiência metafísica, ataca as nádegas da empregada; o “Louco” entrando em campo no fim do jogo, dado que as táticas racionais do técnico do time falharam; a convivência de meu invejado com a Luana Piovani numa ilha deserta; noivo e noiva, advogados, negociando e contratando autorizações para eventuais traições. As Cobras, O Analista de Bagé, A Velhinha de Taubaté, Dorinha...
Meu pecado capital, em relação ao Luis Fernando Verissimo, é o de uma genuína e legítima inveja.  Crescente inveja: se o crescimento do Brasil fosse determinado por esta inveja que sinto, estávamos crescendo mais que a China. Mas isto é papo para outra inveja...
O Falsíssimo é uma homenagem invejosa. Talvez também louvável.
Porque sou Falsíssimo no sentido de menos relevante, menos capaz, de gafanhoto que nunca será o  Mestre; porque devo homenageá-lo; porque cada vez que leio esse desgraçado (no bom sentido...), concomitantemente ao deleite, me nutre a maior inveja que sinto na vida. Pela criatividade simples e pela amizade que  tem com as palavras, as metáforas cômicas e as possibilidades criativas de estrutura da escrita.
E no limite porque, na série sobre pecados, qual o que coube a ele? A gula. Pau a pau com a luxúria na briga pelo posto de melhor pecado. E para não ficar atrás do João Ubaldo Ribeiro e seus Budas Ditosos, Veríssimo compilou, com a competência de sempre, o Sexo na Cabeça. E eu, aqui, falando da inveja... Pecado pouco interessante e antipático, simbolizado num livro infantil da Trace Moroney, que diariamente leio para meu filho, por um horrendo monstro verde.
Bem... segundo Al Pacino, como Milton no filme Advogado do Diabo, o pecado preferido do capeta é a vaidade. Deste, pelo menos, no meu caso mal resolvido com o grande mestre Luis Fernando, eu escapei...  Mas o caso estava mesmo mal resolvido: depois que constatei essa inveja, fiquei obcecado com minha relação com o Veríssimo.  
Pesquisei, refleti, busquei saídas, tentei vencer... Na cultura literária: sou voraz leitor, mas nem dá para começar a competir com o conhecimento acumulado, senso crítico e criatividade no uso e abuso de estilos e fatos que Verissimo consegue, com leveza, transmitir. Quanto a filmes e música, a lacuna é tão grande que nem vale investir letras, muito menos sílabas ou frases. A imagem que vale mais que mil palavras seria a de David e Golias, só que com a vitória do lado esperado.
Na produção literária: criei um pseudônimo e comecei a tentar emular o estilo de meu invejado. Como é difícil! Enquanto isso, aquela máquina humana de escrever não pára de publicar diamantes da diversão, da ironia inteligente, da crítica perspicaz. Para cada crônica medíocre, que demoro semanas a escrever e ter coragem de apresentar a uns poucos amigos do peito, que pelo menos tomarão cuidado para eu não chorar com as críticas, estimo que Veríssimo ofereça, a milhões de “Brasileiros e Brasileiras”, umas vinte maravilhosas novidades.
No futebol, quase cheguei lá: Veríssimo torce pelo Internacional e pelo Botafogo! Eu também. Empate técnico? Não! Ele é provavelmente mais Internacional... Eu sou mais Botafogo. E já torci pelo Ameriquinha do Rio. E, se há coisas que só acontecem ao Botafogo, nem se fale do Ameriquinha. E ele nunca mudou de time, só complementou o original. Eu, um “vira-casaca”. E contra o hino que falava sobre “torcer até morrer, morrer, morrer”
Péra aí... Vem surgindo algo... Aqui está! Lembrei de uma coisa. Detalhes de uma crônica sensacional renascem das profundezas de minha memória. A crônica, obviamente do Luis Fernando Veríssimo, é intitulada “Gaúchos e Cariocas”. Quem leu, entenderá.
Esta crônica é meu Pharmacon, em sentido platônico. Antes, mal usada, contribuía para minha inveja. Agora, administrada para me trazer de volta ao equilíbrio, faz efeito na saúde de minha alma. O próprio invejado me oferece este caminho de cura, a luz de esperança, uma semente de espiral virtuosa que preciso caminhar para expiar meus pecados. O segundo passo me vem imediatamente à mente como obviedade: eu nunca acreditei no discurso de ética impecável do PT. 
´Tá bom, ´tá bom... Joguei pesado agora... A inveja é uma merda.
  
 No Rio de Janeiro, minha Ítaca, numa noite chuvosa, bem coberto e agasalhado, durante meu sabático e voluntariado, agosto de 2011

O Homem do Nariz Empinado


Na segunda crônica que escrevi, registrei para a minha história (nem a História “científica”, nem a “istória” do neologismo com o qual apelidei a brasileira em minha primeira crônica) o apreço que sinto por diversos políticos brasileiros, “caricaturusando” José Sarney e Fernando Collor de Mello como metáforas. Agradeço a ambos por me permitirem tal minimalismo literário, e estendo a muitos colegas deles, farinha vagabunda do mesmo saco, todo o meu desprezo: eu poderia ter escrito, com o mesmo efeito, metaforizando em torno de José Dirceu, sua gang e simpatizantes; ou Serjão, Tonico Malvadeza e sua turma; para não falar de alguns ministros mais recentes...

Mas tal registro do pecado da ira era um apêndice, um “já que” literário. Relembro que meu objetivo principal na crônica era explicar o motivo pecaminoso de meu pseudônimo: a inveja que sinto de Luis Fernando Veríssimo.

Tenho várias crônicas, ainda em elaboração e “encaprichamento” (pois não sou meu invejado), nas quais contarei eventos da vida de meu primeiro personagem, o primogênito e preferido: Notarobaldo.

Notarobaldo é colega de ginásio da Velhinha de Ribeirão Preto, a única prima da Velhinha de Taubaté; acionista de várias empresas, inclusive da Natura, da Vale e da Petrobrás. Só não compra ações de empresas que terminam por “X”, dizem que por pura superstição... Notarobaldo estuda a vida de Mussolitler, um nazi-fascista brasileiro que foi amigo do Pedro Malasartes, e cujos registros foram derretidos, por engano, junto com a taça Jules Rimet. Foi anfitrião do Akfak, uma barata bipolar que virou gente. Notarobaldo é como que um pólo de relações entre os meus futuros personagens aos quais já me apeguei tanto que não consigo finalizar nada que começo a escrever sobre eles. Porque a vida segue e sempre haverá algo mais a dizer. Enfim... começarei apresentando cada um deles, oferecendo amostras das respectivas personalidades. Vamos ao Notarobaldo.

Dizem que ele chegou a fazer tratamento com o Analista de Bagé. O problema de Notarobaldo era o nariz empinado. Desde pequeno, sempre teve o nariz empinado. Com isso, incomodava a todos. Não dava para não notar. Todos comentavam. Como podia alguém ter o nariz tão empinado? Como podia uma pessoa não se dar conta do que ocorria a sua volta, estar sempre com ares alheios? Provavelmente era o ser humano com o nariz mais empinado do mundo.


Obviamente chegou a sofrer bullying-adulto de alguns. Outros acabaram dele se afastando, por uma subliminar imposição social. Muitos, antes de se afastarem, distorceram fatos e amplificaram fofocas.

Foi provavelmente este contexto que fez Notarobaldo, aos trinta e cinco anos, procurar o Analista de Bagé. Uma empresa o contratou (dizem que para cumprir a cota de deficientes físicos...) e seus consultores de auto-ajuda organizacional o convenceram da importância de se buscar o auto-conhecimento e o auto-desenvolvimento.

Aos quarenta e dois anos, Notarobaldo  estava recuperado: de um quase misantropo, por conta do nariz empinado, tornou-se um case de branding pessoal.

Não. Notarobaldo não será personagem de uma crônica sobre como se redimir do pecado da Soberba, não. Nariz empinado, neste caso, não é a popular terminologia denotar arrogância.
O nariz de Notarobaldo era “fisicamente” empinado. Cientificamente, explico: a medula espinhal atinge o seu tamanho adulto antes de o canal vertebral o atingir. Deste modo, até ao terceiro mês de vida fetal, ambos apresentam aproximadamente a mesma taxa de crescimento, com a medula a preencher todo o canal vertebral. No caso de Notarobaldo, ocorreu o contrário.  Daí, os nervos raquidianos foram afetados e também os gânglios dorsais raquidianos. Tudo parou de crescer. De cervical para sacral, passando pelas raízes dorsais e ventrais. A cisterna lombar – que é um fundo de saco dural, após a terminação da medula espinhal, nunca veio a existir. Esta cisterna é consequência de um espaço entre medula espinhal e dura-máter e local propício à acumulação de líquido cefalorraquidiano. Líquido este que Notarobaldo nunca possuiu.

Uma mutação? Darwinianamente vencedora ou perdedora? Falaremos disso em alguma próxima crônica.

No momento, o que importa é saber que Notarobaldo atingiu o ápice do auto-conhecimento e do auto-desenvolvimento. O Analista de Bagé, que começou o tratamento com uma porrada na cara (e, literalmente, piorou o problema original naquela semana), não aceitava que Notarobaldo se colocasse no papel de vitima. O personagem do Veríssimo teve um papel fundamental na recuperação de nosso amigo. Ao deixar de se vitimizar, Notarobaldo usou todo o potencial que tinha reprimido e todas as idéias criativas que acumulou ao longo de uma vida sempre mirando os céus e o infinito: foi logo promovido a vice-presidente de inovação em sua empresa.

Mas neste momento ele já “estava noutra”; se demitiu e recusou vários convites para ser objeto de estudos fisiológicos e psicológicos. E para dar palestras em empresas com e sem fins lucrativos.  Notarobaldo, com sua eterna visão da imensidão celeste, e com intermitentes, inevitáveis, indesejáveis e aleatórios chutes em pedras que estavam no meio do caminho (e conseqüentes dedões do pé consistentemente inchados e sem as respectivas unhas), tornou-se o ser humano com maior equilíbrio e controle sobre o próprio ego. De dar inveja aos mais sábios mestres de Aikido e até ao Dalai Lama, se ele sentisse inveja.

Se tivesse topado participar dos estudos para os quais foi convidado, teria destruído diversas hipóteses freudianas, junguianas, lacartianas; se aceitasse as propostas de emprego ou, pelo menos, dar algumas palestras, teria acumulado mais bens materiais que ícones da humana busca da felicidade, autores consagrados, tais como Eckhart Tole, Deepak Chopra, Debbie Ford, Martin Seligman e Paulo Coelho.

Mas Notarobaldo era um filósofo em essência, um ser frugal por herança genética e um revolucionário provocador-pacifista por força do destino.

Abriu mão de tudo que poderia ter sido em nome do que resolveu ser. E nunca quis dar entrevistas. Daí minha dificuldade de contar suas passagens com a devida fidedignidade. Continuarei tentando...

sexta-feira, 2 de março de 2012

Potência e falta: uma homenagem à Espinosa

Conatus: vida.
Potência = combustível.
Vida: instante.

Não vejo ordem;
Só ilhas afetivas,
“corpos-casulos”

Minha essência,
Vida: intransferível.
Nossa solidão...

Todo = relação;
Efeitos, transformação.
E vice-versa.

Dentro e fora,
o real é o que é,
ao mesmo tempo.

Sim... bricolagens;
sim... caleidoscópios,
Real e todo!

Verão num haikai!
Primavera, outono...
Faltou inverno...


No Rio de Janeiro, minha Ítaca, na cama numa noite fria, durante meu sabático e voluntariado, julho de 2011

O GRANDIOSAMENTE SIMPLES ETERNO RETORNO! ou HOMENAGEM Á DÚVIDA

O GRANDIOSAMENTE SIMPLES ETERNO RETORNO!
 ou
HOMENAGEM Á DÚVIDA
 ou
UM HAIKAI?

"Goza a euforia do vôo do anjo perdido em ti (...) voa e canta, enquanto resistirem as asas" - Menotti Del Picchia
"For happiness, how little suffices for happiness; the least thing precisely, the gentlest thing, the lightest thing..." - Friederich Nietzsche
"Passado e futuro (...) o mesmo engano que me envenenou outrora, buscando naquelas dimensões paz inalcançável que a criança em mim conheceu quando só vivia o agora" - Luiz Seabra


Anjo-criança,
felicidade com paz;
és esperança!

daí

Passado: verão;
eufórico, outrora.
Asa: "pharmakon"...

daí

Hoje: inverno.
Comedindo futuros,
belo e terno!

daí

Eterno anjo,
suficiente asa...
Virou arcanjo?

daí

Felicidade: chão?
À primavera sutil
voltas. Ilusão?

daí...

No Rio de Janeiro, minha Ítaca, numa rede na varanda, durante meu sabático e voluntariado, maio de 2011

quinta-feira, 1 de março de 2012

Gerações e Geração de um Conto



Domingo. Após o delicioso almoço em família, gerações, móveis e autores afastavam pai e filho. Progenitor: Clarice Lispector. Herdeiro: Espinosa. Distantes como durante a semana. Ou próximos como nunca? O filho levanta os olhos; o pai, os óculos.

- Pai, obrigado pelo ensinamento de amor aos livros.
- Filho, foi meio sem querer. Até egoísmo...

Freud explica.

O pai nunca lera Freud. Preferia romances. Nem o filho: preferia Jung.

O pai sempre o presenteara com livros. Aumentava a mesada após cada leitura.

- Escrever também lhe satisfaz. Escreva mais!
- Ando ocupado, trabalho...
- Já poderia se aposentar...

Silêncio. Óculos. Clarice.

- Pai, falando sério. Tenho lido sobre “felicidade” e...
- Autores técnicos... Devia ler romances...
- Eu gosto de escrever! Vamos escrever um livro?
- Muita ambição.

Semana seguinte. Bienal. Pai e filho juntos. Um concurso de micro contos. Bom começo!

Desafio: só 140 caracteres. Escreveram dois: “Gerações e autores afastavam pai e filho; este levanta olhos; o pai, os óculos. – Escrevamos um livro!  - Ambicioso... Bienal: micro contos. Bom começo...” e “ O pai, agora avô, só dava livros ao filho, agora pai. Reclama que o neto não quer brincar; só quer saber de livros digitais na Internet...”

O filhou errou no procedimento de inscrição do concurso de micro contos:

- Não ganhamos.
- Ganhamos, sim, filho. Foi divertido.
- E o livro?
- Eu topo. Podemos tentar...
- Então concordo. Ganhamos!




ODE À ORFF

ODE À ORFF
               Sugestão para degustação: leitura com fundo musical gregoriano

Mulher: Carmina
Beleza, natureza
Canções: carmina

Fortuna = valor?
De Benediktbeuern
Fortuna = amor!

Sorte que roda
Em Carmina Burana
Impetuosa

Na juventude
Com fortuna das canções
Orff, plenitude

Amor, beleza
Na natureza
Cenas festivas

Entusiasmo!
“In taberna”, encontro!
Vinho, beleza

Homem? Carmina!
“Verie leta facies”
Mulher, fortuna

Roda que roda
Deusa-Fortuna roda
“Velut luna”

Fruta madura?
Natureza: Donos? Dons?
Sorte obscura

Azar e sorte
“Amor volat undique”
Mulher e morte

Canções e monges
Antegozam com cisnes
Em Shangri-lá

Monges comendo
Orff paraboleando
Cisnes sofrendo

Cisnenobreza
Mulher, vinho, beleza
Homem, pobreza

Cisne com monge
Humanidade nua, crua
Cour d´amour: longe...

Deusa que roda
Humanidade pura
Roda da vida

Vida que roda
Culmina e invoca
Carmina, moda

Humanidade...
Eruditas mulheres...
Ou homens serão?

Sem romantismo
Carmina ou Burana?
Luz dura na vida

Exuberância!
Natureza é roda!
Vinho, fragrância!

Gira a roda
Impenetrável força
Gira que louca

Monges e cisnes
Impenetrável roda
Força da vida